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Foto do escritorCarlos E Costa Almeida

Centros de Excelência. Uma verdade ou uma falácia?

Atualizado: 18 de set. de 2020


Esta semana recebi a minha mais recente aquisição de literatura cirúrgica. O livro sobre tratamento de hérnias da Society of American Gastrointestinal and Endoscopic Surgeons: "The SAGES Manual of Hernia Repair". A leitura das primeiras páginas do mesmo motivou este post.

Apesar do livro tratar de hérnias, este post tem por base as ideias sobre os Centros de Excelência apresentadas pelo Dr. Bruce Ramshaw (autor e editor do manual) do Department of General Surgery, Daytona Beach, FL, USA. Dado que muitas destas ideias de Centros de Excelência surgem do outro lado do Atlântico, penso ser extremamente importante partilhar convosco as reflexões deste cirurgião americano sobre algo que tem sido tão discutido recentemente em Portugal. Será que já estamos atrasados? Será que a discussão que estamos a fazer em Portugal é desactualizada nas terras de Washington? Será outro o caminho a tomar?

Os Centros de Excelência têm critérios para acreditação, processos padronizados, procedimentos protocolizados, e relatórios periódicos de resultados para uma entidade reguladora. Segundo Dr. Ramshaw o Serviço de Saúde definido tendo por base o Centro de Excelência irá efectivamente impedir a muito má prestação de cuidados, mas por outro lado irá prolongar a mediocridade e impedir a inovação. Porquê?

Pois tudo irá ser centrado em critérios estáticos para manter aquele mesmo padrão, e não centrado na contínua aprendizagem e inovação.


O Centro de Excelência assenta em optimizar a parte e não o todo, assenta numa determinada especialidade do médico e não no doente e no seu tratamento final, assenta em melhorar apenas uma parte do ciclo de tratamento de um doente. Segundo o autor, todo o ciclo de tratamento do doente deveria ser o centro da organização do Serviço de Saúde. Para Bruce Ramshaw esta fragmentação que se tem verificado do Serviço de Saúde com a optimização das partes, é responsável pelo estado insustentável actual dos cuidados de saúde nos Estados Unidos. Segundo o autor a saúde é um sistema complexo com múltiplas variáveis difíceis de controlar, e por este motivo o resultado final não é totalmente controlável e reproduzível apenas melhorando as partes. Num sistema complexo (como a saúde) em que cada parte se tenta isoladamente optimizar, todo o processo não será optimizado.

Um exemplo. Uma equipa de futebol que tenha o melhor defesa, o melhor atacante e o melhor guarda-redes (as partes optimizadas), não significa que tenha a melhor equipa e os melhores resultados (o processo final).

Se juntarmos sempre as mesmas cores azul e amarelo nas mesmas proporções teremos sempre a mesma cor verde, é um sistema simples. A saúde não funciona assim. Bruce Ramshaw dá o exemplo do tratamento de hérnias com prótese: se usarmos a mesma prótese e a mesma técnica em dois doentes distintos, o resultado pode ser diferente. Há inúmeras variáveis impossíveis de controlar na totalidade. Tem portanto de haver estimulo e lugar para a contínua aprendizagem e inovação, e não ficarmos retidos a protocolos e critérios estáticos para uma acreditação do Centro de Excelência.

 

"For a complex system, many parts may need to be suboptimized and all the interactions between the parts need to be managed, measured, and continuously improved. This allows for optimization of the whole process and output."

Dr. Bruce Ramshaw

 

A Medicina não pode ser aplicada apenas com base em fluxogramas, guidelines e protocolos. A Medicina não é só ciência, é também uma arte. Todos podemos ser óptimos médicos, mas uns serão sempre melhor que outros... Deixo estas ideias para que todos possam reflectir e questionar-se sobre as vantagens e desvantagens do caminho que parece estar a ser percorrido pela Saúde em Portugal.

Não fiques estático e padronizado. Questiona, estuda, compreende e inova.

Bibliografia:

Dr. Carlos Eduardo Costa Almeida

Cirurgião Geral

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