Nem sempre as coisas correm bem no emprego. Surge desmotivação, vontade de não sair de casa pela manhã sabendo o que nos espera, vontade de sair daquele local de trabalho, ou talvez mudar de trabalho. Este sentimento leva muitos trabalhadores a mudar... Esta situação é transversal a todas as profissões.
Ao pesquisar na internet causas de mudança de trabalho ou local de trabalho os artigos são imensos, mas todos têm um denominador comum:
“Employees don’t quit their job, they quit their boss!” - Empregados não desistem do seu emprego, eles desistem do seu patrão.
Esta razão é apontada em inúmeros estudos como a principal causa de mudança do local de trabalho. Interessante também perceber que os que mais vezes abandonam/mudam de local de trabalho devido às chefias são os melhores e mais capazes trabalhadores.
Uma das razões apontadas pelo Dr Travis Bradberry (coauthor of Emotional Inteligence 2,0 and President of Smartalent) é a sobrecarga de trabalho colocada nos ombros daqueles que melhor trabalham. Este é um dos erros mais frequentes das chefias, e que faz o bom trabalhador pensar que está a ser penalizado por ser melhor. Além disso, um estudo de Stanford demonstrou que a produtividade por hora baixa bastante no momento em que a semana de trabalho ultrapassa as 50h, e cai para níveis tão baixos quando excede as 55h que nada de útil advém desse trabalho. Tudo isto é piorado pelo facto de frequentemente não haver um reconhecimento do trabalho realizado. Não significa este reconhecimento apenas dinheiro, o patrão/chefia deve conhecer os seus trabalhadores para saber o que estes apreciam, pois para alguns um reconhecimento público pode ser mais gratificante que uma compensação monetária.
Empregadores que apenas se preocupam com a produtividade sem se preocuparem com as necessidades, gostos e paixões dos seus trabalhadores costumam ter altas taxas de desistência. Empresas inteligentes garantem que os seus gerentes saibam equilibrar o profissionalismo com o ser humano. São estes chefes que celebram os sucessos do seu empregado, têm empatia pelos empregados nos momentos difíceis, mas são capazes de ao mesmo tempo os desafiar.
Desafiar o empregado é importante no sentido de aproveitar as qualidades do mesmo. Para isso é preciso gerir. Administrar não tem um fim, é um acto constante. Uma boa gerência presta atenção constante ao empregado. Aqui reside mais uma das desgraças do método de comando da maioria das chefias. Não sabem aproveitar, estimular e incentivar as melhores características e capacidades do empregado. Segundo Dr Travis a maioria dos patrões desculpam-se com “autonomia” e “confiança” para justificar a sua não preocupação e “feedback” para com o empregado. O bom patrão/chefe deve constantemente monitorizar o empregado talentoso e manter a procura de novos locais ou funções que possam estimulá-lo a desenvolver as qualidades que já tem e adquirir novas capacidades. Os melhores funcionários, ao contrário dos piores, gostam de ter um “feedback” constante, e caso a chefia não o faça ele torna-se entediado e desmotivado. O funcionário talentoso deve sentir-se apoiado e estimulado pela chefia.
Outra ideia interessante e importante apontada por Dr Travis é o facto de os funcionários com talento gostarem de usar todas as suas capacidades para tentar melhorar tudo aquilo em que começam a trabalhar. O chefe contente e satisfeito com o “status quo” (sempre se fez assim... é este o protocolo...) limita o talento e amputa os serviços de eventuais melhorias e avanços que esses trabalhadores poderiam trazer. Ao fazer isto, o chefe torna o trabalho insuportável e desmotivante para aqueles talentosos trabalhadores, levando os mesmos a abandonar.
“When talented and intelligent people find themselves doing things that are too easy or boring, they seek other jobs that will challenge their intellects.”
É crucial a chefia estimular o talento, levar o empregado a sair da sua zona de conforto dando-lhe novas funções de acordo com os gostos, motivações e objectivos de carreira do empregado. No entanto, gerir bem não se resume a isto. Gerir bem implica continuar a monitorizar o empregado fora da sua zona de conforto e ajuda-lo a conseguir cumprir essa nova função, a conseguir ultrapassar esse desafio.
Tudo isto e muito mais que poderia ser dito, leva-nos a esta frase escrita na Revista Forbes em Fevereiro de 2017 por Jack Altman (cofundador e CEO da Lattice):
“The cost of a bad manager is too high to tolerate. Not only will people quit much more often, but they’ll be much less productive before they do.”
Segundo aquele autor ser um bom gestor requer trabalho e dedicação, e gerir recursos humanos não é algo que a maioria dos gestores veja como a sua “real” função. Aqui reside o facto de uma má relacção com a chefia ser responsável pelo desinteresse do trabalhador e obviamente pela consequente baixa de produtividade.
Gostaria de realçar ainda um dado apresentado pela Forbes: mudar de emprego é uma óptima forma de aumentar o ordenado. A justificação apresentada é simples. O primeiro empregador não valoriza monetariamente o incremento de experiência e capacidades que o trabalhador adquire ao fim de alguns anos. Aquele continua a ver o funcionário da mesma forma que o via no dia em que o contratou. Após ganho de experiência na empresa, esse funcionário pode ser contactado por outra empresa para desempenhar funções semelhantes mas com aumento salarial concordante com a sua actual capacidade. No momento em que o funcionário comunica ao chefe, já este perdeu a oportunidade de reconhecer e manter o empregado talentoso. Segundo a Forbes, mudar de emprego a cada 2 anos pode ser bastante mais rentável monetariamente que manter o mesmo local de trabalho. Claro que falamos nos Estados Unidos da América, em Portugal será muuuuito mais complicado. No caso da saúde, parece-me que neste momento o Estado Português criou uma forma de “ditadura do local de trabalho” em que após um contracto num hospital público muito dificilmente o médico pode mudar. Sim é verdade. Alguns têm de rescindir contrato (ficar desempregados) para poderem mudar. Irreal num mundo civilizado cada vez mais global...
Porque abordei este tema? Pelo facto de tudo isto se passar neste momento nos hospitais portugueses. O Serviço Nacional de Saúde tem líderes e gestores que, seja porque motivos for, não conhecem os seus trabalhadores médicos, não conhecem as capacidades destes, não conhecem as dificuldades que eles têm em desempenhar as funções, não reconhecem o esforço, trabalho e resultados conseguidos, não estimulam o desenvolvimento e aquisição de novas capacidades e técnicas que podem ser usados para melhorar os cuidados médicos, não ouvem as suas angustias e desejos de futuro. Actualmente parece-me que as administrações e chefias na saúde (a todos os níveis) vivem apenas obcecadas pela produtividade expressa em números, sobrecarregando os trabalhadores sem apresentarem objectivos de futuro a longo prazo, e sem melhoria das condições. As chefias actuais na saúde não têm qualquer relação com os trabalhadores médicos, algo que pode ou está a tornar o Serviço Nacional de Saúde português apático.
Não me parece que seja o simples retorno da exclusividade que vá “prender” os melhores e mais talentosos trabalhadores no Serviço Nacional de Saúde. Tal ideia só pode surgir de mentes medíocres e desconhecedoras da melhor forma de gerir recursos humanos.
Muito mais haveria a dizer, mas limito-me a deixar uma ideia que todos devem reter para que um futuro melhor na saúde nacional possa surgir:
“Train people well enough so they can leave, treat them well enough so they don’t want to”.
Richard Branson, fundador da Virgin Group
Links para bibliografia:
Dr. Carlos Eduardo Costa Almeida
General Surgeon