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  • Foto do escritorCarlos E Costa Almeida

Agressividade entre médicos. Um fenómeno internacional?


Nos últimos dias deparei-me com uma partilha no "Linkedin" por parte do Dr. Carlos Baía, Coordenador do Transplante de Fígado da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, Brasil, sobre um comentário publicado no New York Times que aborda a rudeza/agressividade em meio hospitalar. Fiquei curioso, e fui ler o artigo original publicado no New York Times a 10 de Abril de 2017 pelo Dr. Perri Klass. Incrível como o que se passa nos Estados Unidos e Inglaterra se adequa ao meio hospitalar lusitano.

São abordados diversos pontos:

  1. agressividade dos familiares para com os profissionais e como isso afecta o trabalho médico e de enfermagem

  2. rudeza e agressividade entre colegas

  3. rudeza para com estudantes de medicina e internos

Um grupo de actores fez-se passar por familiares e foi antagonizar os médicos e enfermeiros. O objectivo: avaliar o desempenho após esse confronto. Foi impressionante e preocupante constatar que a capacidade de diagnóstico e decisão foram afectadas. Alguns leitores apontaram o dedo aos profissionais, referindo que esse pior desempenho era vingança. Outros afirmam ser importante tratar sempre bem quem os trata, mas outros referiram que a rudeza também vem do outro lado, e é comum haver má educação por parte de médicos e enfermeiros para com o doente e/ou familiar. A agressividade gera agressividade, e o nosso subconsciente tende a ser igualmente agressivo. Tal tem de ser combatido. Penso que muitos dos problemas com doentes e familiares que podem acabar em processos legais se prendem com falta de comunicação.


Um ponto mais preocupante é o comportamento agressivo entre colegas. Tal não posso aceitar nem compreender. Segundo alguns estudos certas especialidades são "rainhas da rudeza": radiologia, cirurgia geral, neurocirurgia, cardiologia. São apontadas como razões para esse comportamento a carga de trabalho, o burnout, a depressão, e mesmo o abuso de substâncias. Eu pessoalmente acredito que em alguns casos é uma forma de defesa pela ignorância quanto ao caso em concreto, o não saber o que fazer, e por isso não se querer comprometer a expressar uma opinião que ficará registada para todo o sempre. Segundo um estudo britânico, 31% dos médicos é afectado por comunicação agressiva e indelicada por parte de colegas várias vezes por semana. Alguns apontam a hierarquia, a defesa do doente e a cultura, como justificativas para a agressividade. Por outro lado a rudeza é apresentada como não profissional, e por isso não me parece que possa nunca ser justificada entre colegas. Todos trabalhamos juntos para o mesmo objectivo, tratar uma pessoa. Não é o médico quem precisa de ajuda quando a pede a um colega, quem precisa dessa ajuda é o doente, e ser rude nessa discussão é ser mau profissional.

 

"It’s not enough to say rudeness is unprofessional, so therefore don’t be rude. And it’s not enough to say, being affected by rudeness would be unprofessional, so therefore, I’m not affected."

Dr. Perri Klass, in New York Times

 

Também os médicos internos e estudantes de medicina são mais vezes vitimas de rudeza e agressividade por parte de outros médicos e mesmo de outras classes profissionais. A hierarquia é aqui apresentada como uma imunidade à má educação. Parece-me verdade. No entanto, são os mais graduados que mal tratam os mais novos. Porquê? Mais uma vez o burnout, a depressão, a insatisfação com o trabalho, e o abuso de substancias surgem como justificações. O Dr. Perri Klass conta uma história pessoal em que acabou a humilhar publicamente um médico interno. Avalia retrospectivamente a situação e conclui que essa humilhação não favoreceu nem o médico nem o doente.

Resumindo, penso ser um artigo muito interessante que todos devem ler, e posteriormente meditar e tirar conclusões. Uma avaliação do nosso próprio comportamento deve ser realizada como auto-avaliação. A rudeza e agressividade gratuitas entre colegas não é de modo algum passível de justificação. A meu ver, é muitas vezes sintoma de ignorância e incapacidade profissionais, sem no entanto esquecer que o cansaço, excesso de trabalho e burnout têm uma forte influência nesse comportamento, que em nada beneficia o doente e o profissional.

Termino com a última frase do Dr. Perri Klass no New York Times:

"Rudeness affects your spirit, your morale, your connection to your job and your effectiveness in that job. It gets in the way of health, and it gets in the way of healing."

Tentemos todos não ser rudes...

Link para o new York Times:

Dr. Carlos Eduardo Costa Almeida

Cirurgião Geral

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